Branco e Leoni

No alto da rua, um corcel azul, 74, vira a esquerda pegando a rua sâo josé, a mesma onde ano passado a queda de um outdoor da Igreja matou um cachorro e deixou feridos os três filhos de Erivelton e Núbia. Folhas cobrem as calçadas ainda úmidas da garoa fina que caiu toda manhâ. Jardins por fazer, carros estacionados, caixas de correios, cercas, muros, latidos, crianças, um outdoor com o anuncio do reveillon do ano passado. Trinta e seis outras ruas pavimentadas e quatorze de châo cruzam com a principal, somos o quinto maior bairro da cidade, possuímos até um cinema clandestino, uma escola secundaria, uma rádio, um cemitério, um clube social e iremos disputar em outubro o título de penta campeões estaduais de jogos de Gude e Piâo. Na linha de frente, Leoni, da quadra cinco. Dizem que dorme desde os oito com sua dente de leite azul, média, e uma verde escura menor, embaixo do travesseiro. Nos hipnotiza a todos, quase nunca sorri durante as partidas, tanto ataca como se esquiva super bem. Jogada mais simples às vezes ele as faz com a esquerda, levando o público a sorrir, sabe conduzi-los, produz suas jogadas, espera as distancias perfeitas para o tiro certo de seus dedos, gudes fazem curvas alcançando ângulos perfeitos até seus alvos, é incrível sua mira. Com treze anos já havia conquistado quatro estaduais e a admiração de quase todos no bairro, perdendo somente para seu irmão três anos mais velho, Branco, que além de forte adversário era também ninja nos saltos mortais, jogo de piâo e sinuca. Era famoso pela série de 10 pulos de gato no plano, sendo os três últimos sem as mãos. Aquele magrelo esfarrapado exibido chamava na mão de cabeça pra baixo, trazia na linha, e nunca tomava bico. Era dono de um pião vermelho de plástico e um de madeira de goiaba feitos por ele mesmo. Já no sinuca, se convertia num personagem mais boêmio, sapatos e calca social de quando frequentávamos a igreja, e uma camisa branca de botôes que havia trocado por uma lata de gudes com o filho do dono da locadora de videos. Se movimentava como um malandro nato, atirador de elite, fomentador de apostas e figura obrigatória, para alegria de Leandra e ódio de Luana, nas mesas de sinuca das quintas e sábados na rinha de galo de Noel e Ilza. 

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